Quando
eu tinha uns cinco ou seis anos de idade, minha mãe me levou em um programa infantil da Rede Tupi.
Era
comandado por uma fada chamada Euterpe.
Minhas
memórias sobre esse dia são poucas... O vestido da fada creio que era branco,
ela tinha um soldadinho de chumbo como ajudante e havia um castelo. Lembro
nitidamente de caminhar em direção a um castelo. Uma visão espetacular! Ele
tinha bandeiras tremulando nas torres e um enorme portão de madeira.
Comentei
com minha irmã mais velha, que foi junto comigo ao programa, que achava ter
tido essa visão, por ser o prédio onde ficava a Rede Tupi, muito belo e
imponente.
Qual
não foi minha surpresa quando minha irmã disse – Ah não! Você viu foi o cenário
do programa. Se me lembro bem, tinha um painel grande onde estava desenhado um
castelo. Agora, ver bandeiras tremulando fica por conta da sua imaginação.
Pois
muito bem! Que seja! Minha imaginação era muito forte na época, como a de
qualquer criança e com um acréscimo: eu era fascinada por uma coleção que tínhamos
intitulada "Lendas e Conto de Fadas dos Irmãos Grimm". Eu adorava! As
ilustrações eram lindas! E, claro, tinha castelos! Até hoje trago na memória
imagens de algumas dessas ilustrações. Quem sabe aquele castelo que eu vi,
segurando boquiaberta a mão da minha mãe, fosse um deles?
Foi
divertido que a montagem desse blog, me fizesse lembrar desse acontecimento da
minha infância. E que gostoso ficar costurando essa história com minha mãe e
irmã! E costurando daqui e dali, minha irmã acrescentou mais um ponto, dizendo
meio fazendo troça do caso (pois os anos passam, mas irmãos são sempre irmãos)
que eu fui a "estrela" do programa. Pelo que ela relata e minha mãe
confirma, num determinado momento, eu teria saído do lugar onde estava e,
correndo, fui até a fada bem na hora em que ela entrevistava uma criança, e
disse: “quero ir ao banheiro dona fada”. Isso
foi "um vexame" nas palavras da minha mãe.
Tudo
indica, já que o programa era em rede nacional, que o país “inteiro” me ouviu
dizendo isso. E ela acrescenta rindo: - eu não sabia o que fazer com todo
aquele seu entusiasmo e encantamento.
E
para ser franca, continuo muito parecida com a menininha de quarenta e cinco,
quarenta seis anos atrás. Graças aos deuses, ainda me entusiasmo e me encanto
com a vida. E vida e feita de histórias. E são tantas! Estão por aí o tempo
todo: nos livros, num roda diante de uma fogueira em alguma aldeia no mundo, na
pessoa desconhecida que se senta ao seu lado... Difícil não se encantar não se
entusiasmar. E eu sou uma entusiasta quando o assunto é contar, ouvir ou
escrever uma história. E adoro encontrar uma.
Quando
conheço mais de perto uma pessoa, é batata! Conversa vai, conversa vem, acabo
sempre perguntando sobre algo que ela tenha vivido que foi interessante sob
algum aspecto. Sempre há! Já ouvi varias histórias. Umas já me inspiraram até a
escrever, como é o caso da “Menina que ia pro céu”.
Todo
mundo tem uma história para contar, sem exceção. Isso não é fascinante?!
Pois
é, embarcar numa história ou dar vida a uma, causa uma sensação indescritível.
É muito prazeroso e todos nós sabemos disso. Todo mundo na infância já foi
herói, rainha, vilão, monstro, bicho, fada, bruxa, rei... E por aí vai. Lembro
dos meus primos brincando de forte apache e o dia corria com muitos índios e
soldados.
O
que acontece é que já crescidas, algumas pessoas continuam a gostar da
brincadeira. Sou uma delas. Não é por acaso que sou atriz, não é por acaso que
escrevo, não é por acaso que gosto de contar histórias. São movimentos de amor.
Um tipo de amor que quando nasce não morre jamais. E aí sem nem perceber, lá
está você dando voz ao gato ou batendo papo com os amigos imaginários dos seus
filhos e se divertindo tanto quanto eles.
Quando
meu filho fez um ano de idade, dei a ele seu primeiro livro. Um livro de pano.
Cada página vinha com um número e ao lado, animais representando o mesmo:
quatro elefantes, dois coelhos... Eu pegava o livro e inventava
diálogos, acontecimentos até chegar na última página, onde tinham dez
estrelas. Nessa hora eu cantava
“brilha, brilha estrelinha” até ele adormecer. Hoje ele está com nove anos e é
um pequeno leitor. Às vezes voltamos no
tempo e pegamos seus livros de quando era pequenino, para ler.
Um
dia desses, me pediu para ler um que ganhou quando tinha uns três anos de
idade. A história é de um carrinho muito lento, que resolve participar de uma
corrida. Quando eu estava na parte em que o carro possante e pretensioso quebra
e o carrinho vagaroso acelera dando tudo de si até cruzar a linha de chegada,
meu filho me disse: “mãe, a senhora fazia vruumm nessa hora! Faz o vruumm!”
Pois é ele lembra. Talvez o som do “vruumm” que eu fazia ao contar a história,
fosse o som que dava vida e transformava o carrinho num carrão turbinado, capaz
de ganhar qualquer corrida. Caprichei no vrummm enquanto via meu filho
sorrindo.
Já
tive a felicidade de presenciar esses momentos mágicos, tanto contando, como
ouvindo uma história. O sorriso de satisfação, a expectativa diante de uma
pausa, a emoção que nasce com o desenrolar do que é dito, as palavras carregadas
de intenção, os sons, os gestos... E de
repente, a história ganha vida! É maravilhoso sentir tudo isso.
Certa
vez encontrei uma definição brilhante sobre o que citei acima, nas palavras da
escritora Elsa Triolet:
“O
texto escrito, deitado, ao som da voz se levanta e caminha.”
Concordo
plenamente! Toda história, ao ser contada, segue, caminha, ganha vida.
É
algo transformador construir através da voz um caminho para alguma história e
ver o poucos como tudo se dá numa magia misteriosa. A mesma magia e mistério
que encontramos tanto sendo ouvinte, como narrador. É certo que algo vai se
movimentar dentro de você, algo vai escapulir, crescer e com certeza vai te
tocar de alguma forma. As histórias ensinam muito! Seja qual for o desfecho,
seja qual for o sentimento que nos cause, sempre será um
aprendizado, um encontro, um caminho, uma trajetória.
Nenhum comentário:
Postar um comentário